Os Maridos, de Cassavetes

Estamos predestinados a viver em caminho da morte. Cada passo que damos na vida é um passo a menos para nos encontramos com o nosso fim. Diante desse caminho nos cruzamos com vidas e mais vidas e cabe a nós sabermos segurar as que mais importam junto de nós e aprender a viver com a dor da perda daqueles que chegam no seu caminho final antes de nós. É mais ou menos nesse sentido que vida tenta se segurar, e Cassavetes também a contar, talvez, sua história mais marcante e simbolista. Os Maridos não são apenas amigos que estão passando por uma fase de luto por causa da morte de seu companheiro. Os maridos, como os letreiros dizem no começo do filme, são homens que – poderia ser eu ou você – estão entre a vida e a morte (no sentido figurado) e nisso estão a procura da liberdade, espiritual. As brigas, corridas e gritarias que eles causam na rua podem parecer um simples artificio do roteiro, mas quem conhece a verdade do cinema do ator e diretor americano sabe que nada ali é por acaso, nenhum improviso se torna inútil na visão geral. Essa é a forma dos personagens, e também atores, de colocarem toda a dor e sentimento que estão dentro de si. As faltas de diálogos em algumas cenas não subtraem no resultado final do filme. Como muitos sabem e repetem, atos valem mais que mil palavras, e nessa fita os atos são a forma mais sincera de comunicação da plateia com a arte em questão. A prisão sem muros que os personagens vivem a cada cena mostra que eles precisam voltar para a realidade e deixar esse “capricho” de sentir dor e falta de lado. É doloroso ver que a cada momento o fim está chegando, não da vida deles, também, mas de uma jornada em busca de uma falsa liberdade. A liberdade em questão é incerta e imprevista, como o roteiro. Tudo pode acontecer quando se está liberto, nada é certo e muito menos falso. É essa essência que o filme a todo o momento passa, que aquilo é perecível e a qualquer momento pode acabar. Quando chegamos ao fim vemos que a realidade falsa não valeu a pena porque a vida que os maridos vivem é um mundo que eles precisam ser os mesmos todos os dias e todos os momentos sem a chance de mudar e ser eles mesmos. E de novo o fim é o que mais dói, a incerteza do hoje e do amanhã. Sentimo-nos traídos por Cassavetes, queremos que ele nos diga o que vem em seguida nas nossas vidas e que nos diga o que vai ser de nós. No final a dor de que o passado não volta toma conta e a única coisa que nos resta é voltar e voltar a fita para recordarmos de quando fomos felizes, de quando fomos felizes e de quando tudo parecia valer a pena.

Cassavetes talvez seja o realizador mais sincero que o cinema pariu. Poucos diretores conseguiram seguir a essência verdadeira e real que os seus filmes possuem. Seja pela total liberdade que seus atores tinham de criar e serem seus personagens como nos seus roteiros feitos e sentidos na hora. O cinema do pai do cinema independente americano é imprevisível e real, como a vida.

5/5

Deixe um comentário