“A Diáspora de um Gênero” é a melhor forma para tentar entender o que temos na nossa frente aqui. Como se a realidade não fosse condizente com o que está querendo ser dito e o que está sendo sentido. Cowboys acima de tudo é uma fábula sobre não se sentir bem onde se foi inserido: seja no cinema, seja na vida.
Quando começamos a acompanhar a jornada dos errantes protagonistas logo de cara nos deparamos com a confusão. Mas essa confusão é totalmente nossa, nós que criamos percepções diante daquilo que vemos, esquecemos que a existência não se resume a um conceito totalmente individualista, por mais niilista que seja viver em sociedade.
O filme é urbano, mas todos os conceitos narrativos são de uma época do cinema que (mesmo depois de morta e enterrada) ainda parece permear todo o imaginário de um sistema. Da mesma forma que as noções de realidades a todo momento fazem questão de destoar do que se quer homenagear e acabamos diante de uma estética que por forçar a barra acaba sendo convincente e entrega tudo que está disposta a entregar.
Forçar aqui não é um ponto que soa pejorativo. Além de ser várias coisas querendo existir, elas estão cientes que para que essa existência aconteça precisam ir mais à frente dos limites estabelecidos.
É um faroeste porque abraça todas as suas irregularidades e se aproveita delas para que a narrativa seja ainda mais potencializada; ao mesmo tempo que se utiliza sabiamente de questões de gênero para que possamos refletir sobre o papel das nossas percepções e nossas vivências na vida do outro, e como tudo isso é agressivo quando não procuramos entender o novo – que na verdade não tem nada de novo, sempre existiu, mas foi apagado por nossas redomas de privilégios.
A cena de Joe protegendo o pai daqueles que dizem querer protegê-lo é de longe uma das coisas mais fortes que o cinema independente americano fez nos últimos anos. Sempre tivemos a convicção que o pai precisa morrer para que o filho, enfim, se torne homem. Mas é como se além de negar o corpo que lhe foi dado na existência ele também estivesse negando os dogmas tradicionalistas da sociedade para que uma aceitação existisse.
São poucos westerns modernos que conseguem ser tão fortes e bons como Cowboys. Se Bazin dizia que esse é o gênero americano por excelência, deve ser incluído também um parêntese para relatar que o gênero também é o mais versátil e inventivo da sétima arte.
Texto originalmente publicado no portal SiriNerd